Danae

Danae
Klimt, Gustav

sábado, dezembro 27, 2008



No dia em que morri, pouco antes propriamente de morrer, lembro que a dor era muito grande, foi a maior dor que já senti. Começara dias antes, não sei bem ao certo quantos, mas os sinais foram se espalhando pelo corpo um a um. Hematomas pela pele, fisgadas nas extremidades, uma falta de ar indescritível, pontadas no peito e o cansaço de uma longa e difícil vida. No dia de minha morte, poucos minutos antes, eu já pedia pra partir depressa, o mais rápido que pudesse, pois continuar daquela maneira era torturante e para alguém tão pobre e sem recursos o melhor era evaporar e poupar mais dor, para si e para os demais. Então morri. Mas antes disso, segundos antes disso, a dor se foi. Como o milagre que nunca cheguei a pedi por não mais acreditar, a dor deixou de existir. Ou será que já não conseguia mais senti-la? Morrer dói muito. É a maior dor que se pode ter. Viver não dói nem um terço, por pior que seja a qualidade da vida. Mas depois que se morre a dor acaba. Não se é tomado por um alívio e sim por um buraco completamente vazio e escuro. Custa-se a entender onde está e como respirar lá dentro, até que os sentidos todos se adaptam as novas formas das sensações e começa-se a perceber que pode haver calma no meio de tanto ausência, pois nada mais pode lhe faltar já que está morto e não necessita de mais nada. Daí lhe oferecem outra chance de viver. O problema de viver novamente não é a readaptação ou os percalços tão sutis da vida – que só percebemos o quão sutis depois da morte. O problema de viver novamente é a certeza da possibilidade de sentir novamente a dor da morte. E tudo isso para quê? Não, não há nenhum céu a sua espera.

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